Lúcidas e ternas sempre. Por que não?

Há muito tempo, li em algum lugar que o casamento é feito de vários casamentinhos, e estes vão ruindo, aos poucos, um por um. Com certeza, este comentário partiu de uma daquelas mulheres ressentidas de terem esperado tudo de um marido que, na verdade, não lhes prometeu nada.
 O fato é que entramos, quase sempre, na sonhada vida a dois, com estes famigerados complexos – o de Cinderela, eternamente agradecida e salva pelo Príncipe e, o que é bem pior, o de Mulher-maravilha, aquela que conseguirá consertar todos os defeitos do nosso Príncipe muitas vezes nada encantado...

 Já ouvi, por exemplo, mulher que adora dançar, queixando-se do marido que não gosta (aliás, ele nunca lhe disse que um dia dançaria). Ela, porém, incorporando a Mulher-maravilha, acreditou que seria capaz da proeza de fazê-lo dançar com ela uma música que fosse. Os anos vão passando e ela vai percebendo que quem “dançou” foi ela, mas sozinha...  Para completar, algumas ainda ouvem deles que jamais foram enganadas: eles nunca prometeram mudar naquilo que não gostam. E o pior é que o macaco está certo, não é?!

 E assim vamos, muitas de nós, reabastecendo sempre nosso manancial de desilusões,   sofrendo inutilmente ao final de cada casamentinho que nós mesmas nos obrigamos a deletar de nossas vidas, simplesmente por não perceber que aquele marido absolutamente cordato e perfeitamente ajustado aos nossos gostos nunca existiu, nem existirá. O que temos ao nosso lado é um homem de verdade e bastante diferente de nós, que provavelmente também se ressente de não sermos a mulher adoravelmente compreensiva e meiga que um dia ele sonhou ter ao seu lado.

 Esse equívoco e esse sofrimento tolo geralmente nos acompanham por uns bons anos, mas, como tudo cansa, até essa chatice de ficar azucrinando o marido pra ele ser um bom menino também cansa e “acordamos pra Jesus”, enfim! A idade vai chegando e aprendemos que perturbar os nossos pobres maridos o tempo todo dá muito trabalho... Santa Maturidade!

 E aí, vem aquele momento de rara lucidez, em que a gente olha para o marido e o percebe também tão cansado de lutar contra o inelutável, e de só querer ficar sossegado no seu canto, que ressurge em nós uma ternura imensa e bastante atrasada por este homem maravilhoso que temos ao nosso lado, este companheiro de tantas jornadas, tantas mesmo, que até nos esquecemos de lembrar quanto é bonita a nossa vida, a nossa família, os filhos, os netinhos, apesar das inúmeras brigas, apesar dos ressentimentos...

 Não! Nada de “apesar”!

Tudo deixa de ser obstáculo quando entendemos, enfim, que o que é real e verdadeiro não é sofrimento, é vida, faz parte do caminho. E não há um caminho para a felicidade – a felicidade é o caminho. Não precisamos chegar para ser felizes. Já somos felizes!

  Por que não somos sempre assim, lúcidas e ternas? Boa pergunta...



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